quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Pesquisa científica diz o que é preciso para “Pensar fora da caixa”

É ótimo quando as pesquisas científicas confirmam aquilo que a gente sabe, mas não podia apresentar com dados e confirmação científica, não é mesmo? Foi o que aconteceu na edição setembro/outubro da revista da HSM Management: foi publicado um artigo e uma entrevista com o Professor Gregory Berns, físico, neurologista e engenheiro biomédico que trabalha nos departamentos de psiquiatria e economia da Emory University, nos Estados Unidos. O livro mais recente do Prof. Berns se chama “Iconoclasta: um neurocientista revela como pensar diferente.” No livro, o Prof. Berns divulga resultados e conclusões de suas pesquisas na área do pensamento criativo e da inovação. São conclusões importantes do ponto de vista científico, mas nem todas chegam a surpreender quem passou a vida toda trabalhando com criatividade e inovação numa base diária. Uma das conclusões mais diretas e efetivas do Prof. Berns é a seguinte:

- “Para “pensar diferente” a atitude mais benéfica que você pode ter é se colocar fora de seu ambiente usual. É raro que as pessoas tenham idéias novas enquanto estão sentadas em seu escritório ou interagindo com as mesmas pessoas todos os dias. Observamos que se colocar em uma circunstância inédita ou diferenciada, seja numa viagem ou encontrando pessoas que não vemos todos os dias, é de longe a melhor forma de fazer com que o cérebro saia de seu modo previsível e desperte a criatividade inerente.”

Os escritores sabem disso há muito tempo, daí tantos “livros de viagens” e romances escritos durante estadias em países diferentes, as chamadas “obras do exílio”. Pintores também são famosos pela inspiração fornecida por novos ares e paisagens diferentes. Diretores de cinema como Woody Allen e David Lynch já endossaram a tese. E os melhores criativos que conheço, inclusive nas várias agências nas quais trabalhei, sempre foram unânimes em apontar o valor inestimável de mudar o cenário para ter suas melhores idéias.

Ao sair da mesa, tomar um café, ir até a esquina para comprar um sorvete, ou qualquer coisa que quebre a rotina e os tire de trás de suas mesas, a criatividade sempre parece fluir melhor, com mais facilidade, mais rapidamente. Naturalmente, isso sempre foi verdadeiro pra mim também, e por isso sempre estimulei as equipes de criação que dirigi a terem essa atitude de mudar de ares e evitar a rotina de ficar atrás da mesa. Previsivelmente, nem sempre isso agradou a todos nas agências onde trabalhei.
Muitas vezes o pessoal que não era diretamente responsável por criar a nova idéia, a campanha ou o plano inovador achava que se o pessoal não estava sentado à sua mesa, fazendo cara de compenetrado, escrevendo ou ilustrando – não estava produzindo.
Sempre defendi o contrário – o criativo é mais produtivo sempre que ele ”sai da caixa”, qualquer que seja a caixa: a mesa, a baia, a sala de reuniões ou o horário exato que se espera que ele faça. Milhares das melhores idéias aconteceram enquanto os criativos estavam dirigindo de volta pra casa; quando eles estavam tomando banho na manhã seguinte ao dia do briefing; quando eles saíram de suas mesas para tomar um café e dar uma volta – sem necessariamente fazer cara de conteúdo: simplesmente indo até a padaria da esquina, despreocupadamente.

Pensando bem, nada mais óbvio: para que as pessoas pensem fora da caixa, deixe que elas saiam das suas caixas! Parece a coisa mais simples do mundo – mas não costuma ser simples no cotidiano: os empresários, os clientes e o pessoal do atendimento normalmente reclamam, se chateiam e agem como se o criativo não estivesse fazendo seu trabalho cada vez que ele tenta sair da caixa física, ou da caixa dos horários exatos aos quais a burocracia gosta tanto de submeter as pessoas na ilusão de controlá-las. No caso de um trabalhador intelectual que executa tarefas criativas, um controle absolutamente ilusório, porque ficar sentado à mesa com cara de preocupado nunca ajudou ninguém a ter uma idéia feliz, inovadora, inspirada, arejada. De fato,com também está hoje comprovado cientificamente, idéias felizes e produtivas têm mais chance de acontecer quando as pessoas estão felizes. Trancadas nos limites da sala, do horário estrito e da burocracia, as pessoas ficam menos felizes. E suas idéias ficam burocráticas, sem graça, sem inovação.

Curioso que burocratas cinzentos se perguntem “porque é tão difícil encontrar idéias que sejam realmente “fora da caixa?” É exatamente por aquela atitude que os criativos sempre valorizaram tanto, e que os mesmos burocratas sempre chamaram de bobagem, frescura, ou coisa muito pior.

Mas agora, pasmem: tem até comprovação científica!

© 2009. Paulo Ferreira. Todos os direitos reservados.

terça-feira, 13 de outubro de 2009

HOMEM EM GUERRA

O homem dessa primeira década do século XXI é um homem em guerra. O estado de guerra mudou com o passar dos tempos. Até o início do século XX, era uma coisa física, real, aberta. Na segunda metade do século XX, tornou-se uma guerra de ameaças entre nações, a guerra fria. E no final do século XX e começo do século XXI, tornou-se uma guerra interna, de cada homem consigo mesmo.
Vivemos em guerra contra nossas limitações. As do corpo ou as da mente. Lutamos contra nossos limites, físicos, mentais ou espirituais. Vivemos em guerra por sermos hoje mais materialistas que nunca, e mais individualistas que nunca. Toda a tecnologia e as novidades da área de beleza e saúde nos convenceram que podemos ser jovens para sempre, belos para sempre. E se não somos suficientemente belos, temos mais que possibilidade: temos dever, obrigação de nos melhorarmos.
O homem atual não sabe o que é paz. Embora não viva a guerra aberta nos campos nem a guerra fria entre nações, vive a guerra interior da qual não pode escapar. Aceitar-se, compreender-se significa uma rendição inaceitável nesse modelo perfeccionista e consumista. Não fazer cirurgia plástica, ou não fazer a enésima especialização na carreira, torna-se imoralidade.
Descanso é algo mal-visto. Descanso é algo que somente os muito ricos e muito belos deveriam ter. E mesmo esses não têm. Sentem-se igualmente em guerra com eles mesmos, não se aceitam, querem o aperfeiçoamento constante, contínuo, a riqueza crescente.
Não importa o tamanho da montanha de dinheiro que tenham hoje. Se amanhã não tiverem ainda mais, sentir-se-ão fracassados, perdedores. Hoje, quase todos vivem exaustos.
Hoje, muitas pessoas, num dia de trabalho, não dizem que vão almoçar. Dizem que vão apenas “comer qualquer coisa” ou “pegar um lanchinho”. As pessoas têm vergonha do tempo que passariam alimentando-se com calma, almoçando e conversando enquanto o fazem. Um almoço que leve mais de 30 minutos e não seja dedicado aos negócios é praticamente uma vergonha. Aqueles que o fazem, às vezes não se permitem admitir que o fazem, por medo das críticas. Envergonham-se do bem-estar. Aqueles que porventura num dia específico estejam mais tranqüilos, ou menos atarefados, procuram esconder isso dos demais. Porque há muito medo da inveja alheia, e ao mesmo tempo, medo de passar a vergonha de não estar alinhado com o máximo esforço pela totalidade do tempo.
Não ter olheiras, insônia, preocupações infinitas e não estar exaurido significa, para muitos, ter de esconder isso para não se envergonharem de si mesmos.
Não se permitem tempo para usufruir o que tem. Não se permitem o mínimo tempo para reflexão. Não conhecem o significado da palavra paz. Não conhecem mais o significado do conceito interior de paz.
Olhe nos olhos de um homem contemporâneo. Eles nunca param. Precisam buscar incessantemente tudo aquilo que estão perdendo. Nosso tempo febril não permite piscar. Fechar os olhos ou desligar o celular. Todos já os mantém ligado mesmo nos teatros e cinemas. Como suportar o risco de perder algo? O que quer que seja; perder é insustentável para nós, hoje.
Mas estranhamente algumas perdas são toleráveis ao homem contemporâneo: a perda da nossa humanidade, da nossa falibilidade, do nosso sagrado direito à imperfeição e à necessidade de descanso. Acima de tudo, toleramos perder a paz interior. Pior ainda, ver que tantos consigam orgulhar-se disso.

© 2009 Paulo Ferreira. Todos os direitos reservados.