segunda-feira, 28 de maio de 2007

Diálogos - 2

Diálogos - 2

Elas estavam falando de dinheiro, mas você sabe, sempre acabam falando das pessoas que as contratam...

E as pessoas que contratam, falando das contratadas.

Os ricos falam de dinheiro de um modo muito mais à vontade.

Talvez em outros países, porque aqui todo mundo tem medo de dizer que tem dinheiro.

Mas não é engraçado que os pobres falem dos ricos e os ricos falem dos pobres?

Porque é que os ricos falariam dos pobres?

Porque falam, o tempo todo. Falam da empregada, de como o porteiro age, de como a filha da faxineira gasta dinheiro...

Acho que é uma coisa de olhar “o outro” – a classe social separa, coloca num outro patamar, e então você pode criticar e falar à vontade, porque não te atinge, os problemas são outros.

Tem problemas que acabam sendo iguais. Acho que fofoca é fofoca, tudo igual – falam todos sobre todos e pronto.

Também. Mas tem um fascínio naquilo que não tem nada a ver conosco, nada a ver com a nossa realidade. O pobre diz que se fosse rico faria tudo diferente. O rico também: diz que se fosse pobre, agiria de um modo totalmente diferente.

Nenhum tem a menor idéia do que está dizendo, na verdade.

Não tem, não faz idéia de como é...

E a gente tem?

Claro – no padrão Brasil, a gente se sente rico em alguns momentos e pobre em outros – na verdade, só quem está no meio enxerga um pouco de cada lado.

Mas e essa coisa de achar que se fosse você, seria diferente – todo mundo tem mania de se achar exceção.

Pois é.. Exceção coisa nenhuma, porque quando você vai ver na prática, as pessoas fazem as coisas de um modo muito igual...

Sabe uma coisa que é muito engraçada? As pessoas que não tem muito dinheiro dizem sempre: se eu tivesse muito dinheiro, parava de trabalhar hoje mesmo. Já as pessoas que tem muito dinheiro, normalmente dizem que querem trabalhar até o último dia das suas vidas.

Ah, mas eu queria ver alguém dizer que quer fazer isso sendo lixeiro, isso você nunca ouviu...

É, quem quer trabalhar é porque gosta do que faz

Ou porque está sendo bem pago, mesmo que não goste tanto.

Talvez, mas é porque pode escolher – o lixeiro não pode escolher nada: parou de trabalhar, morre de fome. Então, não podendo escolher, ele é obrigado àquilo – e todo mundo odeia ser obrigado a algo. Se você não precisa trabalhar pra viver passa a ser escolha e pronto: acabou o problema.

Porque você escolheu, acabou o problema?

Ora, se você escolheu e não acabou o problema, é pior ainda, porque a culpa seria toda sua: foi você que escolheu e está achando ruim?

Bom, na pior das hipóteses, se você pode escolher, vai lá e muda; escolhe outra coisa.

Ou fica reclamando.

Mas aí já é outra conversa: tem gosto pra tudo nessa vida, e como tem gosto pra tudo, tá cheio de gente que adora reclamar. Não muda nada, embora possa mudar tudo, simplesmente porque ama viver reclamando, não sabe ficar satisfeito com nada, nunca. Tem pavor de satisfação?

Acho que não é pavor não. Acho que é só porque não sabem o que é estar satisfeito: nunca sentiram isso na vida.

sexta-feira, 25 de maio de 2007

Diálogos

Diálogos são reais e ficção ao mesmo tempo.

O melhor diálogo ficcional já aconteceu, ontem mesmo, na mesa ao lado. Os melhores diálogos das nossas vidas são aqueles que nos parecem escritos por alguém mais talentoso que nós mesmos.


- I -

Eu quero só a verdade, só isso.

Mas.. não dá pra você querer algo mais fácil?

O que é mais fácil? Pelo amor de deus... a verdade é o que é.. você não precisa inventar, não precisa criar nada, é só dizer o que é e pronto.

Hum hum. E arcar com as conseqüências – não esqueça dessa parte.

Mas quem tá pedido a verdade vai brigar depois por quê?

Porque, eu não sei – mas sei que é assim. Você pede a verdade, o idiota diz... Você briga em seguida. Porque verdade é foda.. Não é pra agradar, é a verdade. Quase ninguém tá pronto pra verdade nunca.

Por isso todo mundo mente o tempo todo então?

Claro. É muito mais fácil e mais agradável. Dá menos dor de cabeça. A verdade às vezes é muito chata.

Mas é um saco viver sem nunca ouvir os fatos

Os fatos ninguém nunca tem. Porque tudo é sempre a interpretação de alguém sobre os fatos. Fatos são só o que você mesmo vê – e ainda assim, são os seus fatos – porque fatos, assim, puros – esses não existem mesmo.

Que chatice. Quando alguém te diz algo que não lucra nada por dizer, pode ser a verdade.

Pode. Mas raramente é.

Verdade radical. Aliás, o que alta nesse mundo são pessoas e coisas mais radicais – tudo muito médio...

É porque o médio, o mediano, é mais fácil, menos arriscado e acaba sendo mais fácil se sustentar sendo médio. Já viu quantos gênio e artistas só se ferram? Ser idiota dá prejuízo, mas ser inteligente demais também: o cara fica pensando demais na vida, avaliando tudo, entendendo tudo... Enquanto isso um mediano vai lá e vende uma coisa qualquer, ganha dinheiro e o inteligentaço acaba pensando com o bolso vazio.

Legal. Mais uma força pra campanha contra a educação, pra que estudar, pra que se informar?

Mas é, né? O que se recebe de aumento nos salários muitas vezes não dá pra compensar o investimento que se faz nos cursos e diplomas...

Seria cômico se não fosse trágico

Seria trágico se não fosse cômico...

Você pode imaginar uma pessoa dizendo sempre a verdade? Não rola, isso é personagem de programa de humor, não é gente.

Sinceridade não é pra qualquer um. É só pra quem merece. Conversa mole você pode ter com qualquer idiota. Mas sinceridade não – porque sinceridade custa muito caro quando você entrega pra pessoa errada.

Pra que deixar qualquer pessoa saber o que você pensa? Pra qualquer um a gente tem a conversa de elevador, o papo sobre o clima, o será-que-chove-hoje e tá muito bom.

Certo, mas e esse tipo de conversa, que é quase metalinguagem, esse tipo de conversa que é falar sobre o que é falar com os outros que não estão aqui agora? Com que tipo de gente se tem esse tipo de papo?

Com quem você acha, sente ou pelo menos acredita que é como você, que é farinha do mesmo saco que você é.

Não sei se eu gostei disso.

Não é pra gostar não. É só o fato.

Hmmmm

É o fato puro e simples.